O Supremo e a Política

Que o Supremo Tribunal Federal julga processos que envolvem questões puramente constitucionais, todo o mundo sabe; daí ser tratado de Tribunal Constitucional. Mas que os julgamentos feitos por essa Corte, em processos em que se discute matéria eleitoral, encerram, por ser-lhes intrínseco, um viés de natureza política subjacente à questão jurídica, não está suficientemente claro para muitos cidadãos, que, não raro, confundem e imaginam tudo, menos que aquela decisão colegiada é fruto da aplicação escorreita do texto da Lei Maior ao caso concreto. A razão disso, além da falta de tradição e vivência constitucionalista em nosso país, talvez esteja notadamente no fato de o critério político parecer dominar os outros critérios no momento da escolha do nome do jurista candidato a tomar assento na Suprema Corte. Donde a visão deturpada, que muitos têm, de que a mais Alta Corte de Justiça do país não é senão uma ágora política, e não só política, mas político-partidária, como se os ministros ali decidissem de acordo com a vontade do grupo político responsável pela sua indicação e nomeação. Nada mais temerário e inverídico.
De todo modo, cumpre sublinhar que o Supremo, muitas vezes -- ainda que em casos de cunho não eleitoral, mas exercendo, igualmente, por via reflexa, o seu lado político –, termina sobressaindo-se mais como uma espécie de Tribunal Político, na medida em que seus julgados tenham repercussão política, no sentido de serem capazes de interferir na vida da nacionalidade. A propósito, é bom lembrar que a Constituição Federal é também chamada de Carta Política. De modo que o julgado que a toma como fundamento maior de sua decisão, só pode ter, em última análise, um caráter político. Aliás, diz-se até que, se as leis são elaboradas pelo legislativo e sancionadas pelo executivo, órgãos esses eminentemente políticos, até aí, a rigor, são só leis em potencial, mesmo porque podem vir a ser, no todo ou em parte, anuladas pelo judiciário; na verdade, este é que, valendo-se do trabalho de interpretação jurídica, tem, no fim, o poder de dizer que a lei será o que ele disser que ela deva ser.
A razão deste artigo é o fato de que houve uma crítica severa, com foros de censura, ao resultado do julgamento recentemente realizado pelo Supremo com base na chamada lei da ficha limpa. Portanto, um caso de Direito Eleitoral, com implicação obviamente no campo político – e político-partidário.
Os inconformados tentam desqualificar os votos vencedores, porquanto não teriam os ministros, que os proferiram, consultado, no seu mister de interpretação jurídica, o espírito da lei da ficha limpa, mas apenas se apegado à letra fria do texto constitucional ventilado; depois, não teriam levado em consideração a vontade do povo manifestada num projeto de lei de iniciativa popular, com mais de dois milhões de assinaturas, e de que derivou a Lei Complementar nº 135, de 04 de junho de 2010, que teria criado um paradigma ético e cidadão. Mas, como advertiu o ministro Luiz Fux, o texto constitucional é que encerra o substrato ético-jurídico a que devem todas as normas, que lhe estão hierarquicamente abaixo, ajustar-se.
A novidade, desta feita, é que os seis ministros vencedores não foram acusados de fazer um julgamento político, na acepção pejorativa do termo, porém de promover um julgado eminentemente ‘técnico’. Tudo sofisma! Mero jogo de palavras!
Na verdade, o que os votos dos seis ministros fizeram de mais importante foi assegurar a validade do preceito constitucional, constante de seu artigo 16, violado pela aplicação indevida da lei da ficha limpa nas eleições de 2010, com reflexo pedagógico na questão fundamental da segurança jurídica para a manutenção das liberdades públicas e do próprio Estado Democrático de Direito.
Então, dessa forma, a decisão do Supremo Tribunal Federal, taxada de ‘técnica’ pelos inconformados críticos, talvez tenha sido a melhor política nesse caso.

 
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