Somos todos criminosos?

De início, convém observar que o conceito de crime é algo relativo no tempo e no espaço. De modo que o que é crime em um país, pode não ser em outro; e o que é crime hoje, pode não ser amanhã. Depois, é injusto dizer que alguém que um dia cometeu um crime, um fato isolado em sua vida, seja um criminoso, como se isso fosse uma marca determinante de seu caráter. A propósito, se fôssemos condenar alguém por toda a vida, apenas pelo seu passado reprovável n'algum momento, não teríamos nunca permitido a reabilitação de pessoas que se tornaram grandes nomes da nação, da mesma forma que a Igreja não teria admitido a conversão de pecadores, até confessos, que se transformaram em santos da devoção de muitos. E se a história das grandes conflagrações fosse contada pelos vencidos, quantos heróis hoje não seriam considerados os grandes criminosos da humanidade? Por outro lado, não é lícito passar a idéia de que o "crime" seja um fato apenas jurídico, porque isso é uma visão reducionista da realidade, o que implica invariavelmente reações preconceituosas e discriminatórias por parte de parcela da sociedade. Ora, numa sociedade capitalista, os crimes contra o patrimônio, por exemplo, não são um problema de natureza meramente jurídica, mas envolvem também questões filosóficas, biopsicossociológicas e econômicas. Portanto, como se vê, a questão proposta por um festejado jurista é de alta complexidade. Só para provocar, Machado de Assis, num de seus belos contos, termina afirmando que "há gatunos que nunca furtaram um par de sapatos". Pois bem. E se o homem, como assevera Jorge Severiano (em Criminosos Passionais, Criminosos Emocionais), é um "ser eminentemente emocional", quem, então, no que respeita aos crimes contra a vida, a integridade física ou a honra, há de garantir sinceramente que dessa água jamais beberá? Com efeito, como diria a personagem do Grande Sertão-Veredas, "viver é perigoso". Enfim, urge propugnarmos, nas sábias palavras de Ferri, "menos justiça penal, mais justiça social". Oxalá essa discussão e o livro do renomado professor possam contribuir para que nos tornemos indivíduos mais tolerantes, à medida que vislumbrarmos cada vez menos o cisco no olho do outro, propiciando assim o vermos, conscientemente, a trave que eventualmente tenhamos no nosso. Pois, como diria Pessoa, "todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo, e eu tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil". É isso.

 
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